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Por que muitos não valorizam o trabalho criativo?

Todo profissional provavelmente vai passar por algum momento em que ele ou a categoria foi desvalorizada, independente da área ou da experiência acumulada. Por que isso acontece?
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Todo profissional provavelmente vai passar por algum momento em que ele ou a categoria foi desvalorizada, independente da área ou da experiência acumulada. Então, não é uma exclusividade nossa como designers, fotógrafos, escritores e tantas outras profissões do universo criativo.

Mas não cabe a mim falar dessas outras áreas, então vamos falar do nosso mundo mesmo :)

Talvez você tenha ouvido/visto algumas dessas frases abaixo (leia tomando um delicioso suco de maracujá):

Se soubesse mexer no programa, eu mesmo faria.

Com certeza você pode fazer isso! Você é ótimo com computadores.

Faz uma artezinha legal aí.

Ah… Você é designer? Que legal! Então você fica aí sentado o dia todo.

Você quer mais que R$ 50 nesse logo aí?

Só mais essa alteração! Prometo que é a última.

Como assim eu preciso pagar por essas alterações?

Você consegue chegar no mesmo valor que esse outro design aqui?

Meu filho também mexe no Photoshop! Ele tem 5 anos.

Já ouvi várias dessas máximas em situações que eu tinha dito que era designer. Ironicamente, como também sou professor, elas poderiam surgir logo depois de escutar “Você também trabalha além de dar aula?”.

Mas por que essas situações acontecem conosco? Falta de compreensão dos de fora ou, pasmem, de nós mesmos?

Obviamente muitas pessoas valorizam o trabalho dos profissionais dessa tão falada Economia Criativa. Normalmente essas pessoas já tiveram um momento em que necessitaram e, consequentemente, viram a importância de um projeto bem feito nesse aspecto.

Então, repito, não temos muito do que reclamar, porque existem inúmeras profissões que são bem mais desvalorizadas do que as nossas.

Mas por que essa falta de compreensão ainda existe? Aqui eu listei alguns possíveis questionamentos para refletirem:

Qualquer um pode trabalhar com criação?

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Qualquer um pode ser o que quiser, isso é claro. Mas a área de criação é desejada por muitos por parecer ser um escape de uma possível rotina, é algo que a pessoa faz por prazer em suas horas vagas. Ou seja… Um hobby.

Mas eu não seria um advogado ou médico por hobby.

O nível de dedicação, estudo e prática que qualquer profissão exige para ser aplicada da maneira adequada precisa ser levado em consideração para qualquer área. Ótimos profissionais iniciaram suas carreiras nas horas vagas, enquanto atuavam em outras áreas. Mas em algum momento essa chave precisa girar.

Estamos todos em um cenário aberto, onde atores podem ir e vir e participar da cena. Se isso o afeta muito é porque precisa estudar mais para ser um protagonista.

Você sabe defender suas ideias?

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Mais uma vez é o diferencial que define um bom e valorizado designer.

Toda opinião é um ponto de vista e tem uma boa chance de ser diferente do ponto de vista do seu cliente.

Se você sabe que a sua opção é a melhor para ele, por motivos que possam ser defendidos como além de um mero gosto pessoal, cabe a você mostrar isso e fazer com que ele enxergue da mesma maneira que você, nem que tenha que dar uma aula de teoria de cores, gestalt, fibonacci, etc.

Existe certo ou errado na criação?

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O campo da criação tem inúmeras vertentes. E o certo e errado de cada uma delas é totalmente relativo. Mas não no design.

Na arte, por exemplo, bom ou ruim, certo ou errado, são coisas que não convém em responder considerando apenas a sua vivência, gosto e até mesmo estudo em arte, porque até mesmo os grandes críticos vão ter opiniões totalmente diferentes da mesma obra.

Arte é o oposto do design na parte comercial. Eles se assemelham na questão do sentir, mas o objetivo é totalmente diferente. Todos podem criticar, falar o que sentem ao ver uma determinada obra, isso independente de seu autor, movimento e técnica. Mas ainda sim é o seu sentimento contra o do autor.

Como muitos devem saber, design, entre algumas definições, quer dizer projeto. E um projeto precisa de técnica, estética e emoção, assim como a arte, mas no caso do design, precisamos incluir alguns fatores importantes: o objetivo comercial, atingir o público alvo e passar uma mensagem.

Logo, existe certo ou errado nele. Porque se a mensagem não for bem passada, a leitura está péssima, o uso de cores não condiz com o tema ou as proporções não fazem sentido, não adianta falar que é apenas um detalhe estético. Está errado.

Você é mesmo uma vitima?

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Deixei esse por último para fechar a pergunta do título por si só. Por que muita gente não valoriza? Porque nós mesmos precisamos valorizar mais, criando uma imagem melhor da nossa profissão, do nosso trabalho e de nós mesmos.

Algo que é perfeitamente normal é a utilização de estereótipos para caracterizar pessoas e profissões. Utilizamos justamente quando entendemos pouco ou nada do que o outro lado representa, isso simplifica nosso entendimento. Todos gostam de coisas simples.

O problema é que o estereótipo do designer tomou conta da vida de uma boa parte da classe, com suas vestimentas e acessórios, escolha de ferramentas e softwares, gírias e gostos culturais, entre tantas coisas. O Ctrl C + Ctrl V que essa situação causa não combina em nada com a criatividade que a profissão originalmente propõem.

E dentro desse estereótipo criado e alimentado por nós mesmos, temos o “dom”. O designer é visto como um profissional que já nasceu com o dom de criar. Uma criança que sempre foi criativa na escola tem uma grande chance de virar um profissional da área criativa no futuro.

Errado? Claro que não! Mas esse dom não pode ser a única motivação para a profissão, porque se você já nasceu com “isso”, o que te faz melhor do que os que estudaram anos, em outras profissões, para serem o que são?

E isso é uma das coisas que acredito que mais desvalorizam uma área, se comparada a outra. Se existe um dom para algo, esse dom precisa ser comprovado com técnica e teoria para que o seu trabalho seja visto como algo realmente pensado e não criado de uma inspiração divina e entusiasta (mas nada impede que esse seja o pontapé da criação). Porque o dom faz parecer que o trabalho foi feito facilmente, foi algo natural.

Então, se você não quer ser vitima, não se faça de uma. Prove que seu trabalho não foi feito a partir da primeira ideia que teve ou que demorou somente alguns minutos para executa-lo. Aplique o que aprendeu de maneira consciente e deixe que a liberdade da criação seja o seu combustível e inspiração mas não seu caminho cego.

Imagens do post via Shutterstock

Ver Comentários (7) Ver Comentários (7)
  1. Estou vivendo um momento até parecido. Não por questão de valorização do trabalho, até porque, nesse caso, o valor foi bem legal. Acontece que a cliente criou um modelo no computador, e me mandou, dizendo que queria daquela forma. Fiz, mas de uma forma bem trabalhada e simétrica, que o caso exigia. Eis que, ontem pela noite, recebo o seguinte email:

    Ficou ótima! Apenas gostaríamos que aproximasse nossa abelha rainha, um pouquinho
    mais (milímetros) das letras, ficando assim, perfeita! Com isso, pode concluir
    o projeto, com as bênçãos de Deus.

    Quanto a sua proposta (primeiro modelo) nós também gostamos. Todavia, como lhe disse,
    tem toda uma história e um ritual no modelo escolhido. Foi somente por esses
    detalhes bastante particulares, que decidimos optar por nossa abelha rainha. A
    gente gamou nela, entende? rsrsrs Não sei como explicar isso, mas a gente gamou
    naquela abelhinha. Foi amor à primeira vista. A gente até tentou ver outras
    opções, como àquelas que lhe enviei logo no início, mas não rolou. Nossa mente
    só pensava nela! rsrsrsr Isso ocorreu com o nome também. Mais de cem nomes, mas
    depois que pronunciamos NOME DA MARCA… É esse mesmo!!! Não era outro não. Ele
    estava guardado para o nosso negócio, assim como nossa abelhinha. Eles foram
    feitos um para o outro, como Romeu e Julieta, pois se completam. Agora, não
    poderão mais caminhar isoladamente, uma vez que também farão parte das nossas
    próprias vidas..

    Simplesmente não sei como me posicionar. Se descontinuo o trabalho, que já recebi. Se dou prosseguimento, pois tem mais demandas ou se deito em posição fetal e choro, pedindo o colo de minha mãe.

    1. Olha, Felipe… A posição fetal pode afetar sua respiração no sono, além de dor nas costas… Não recomendaria ^^

      Agora sobre o que aconteceu com você… Esse caso não é raro. É mais uma situação que o cliente queria uma pessoa que apenas executasse o que ele tinha na cabeça. Mesmo que você apresente todas as alternativas muito melhores, ele está, como ele mesmo falou, apaixonado pela ideia inicial, e essa paixão é cega.
      O importante é que você fez seu trabalho da melhor maneira possível. Infelizmente o resultado final não depende só de nós.

      Quanto a como se posicionar… Romeu e Julieta foram até o “fim” também. O jeito é prosseguir e deixar a abelhinha do jeito que querem… Outro cliente terá a chance de ter um trabalho seu mais criativo.

      1. Concordo com o Julian… e geralmente eu exponho esse problema ao cliente, digo que não recomendaria tal modo para o trabalho, mas que, afinal de contas, quem decide é ele.. é mesmo uma lástima, mas pelo menos você cumpriu o seu papel e não precisa dizer a ninguém que foi você que fez o trabalho hehehe. Eu trabalho com contrato e então a questão das alterações é pautada por ele – estipulo que são aceitáveis até 3 alterações, desde que correspondam ao que foi solicitado no briefing inicial, caso contrário há revisão de valores. Boa sorte!

  2. Este assunto é bem polêmico mesmo, e talvez por isso também pouco discutido. Ainda não cheguei a uma conclusão, mas penso que ainda não temos uma resposta razoável para a questão – por que as pessoas não valorizam o trabalho criativo? A princípio eu penso que falta respeito pela profissão, pelos designers e publicitários, por exemplo. Você constrói um projeto baseado em um briefing completo, em anos de estudo, na experiência que tem, justifica cada detalhe em conceitos teóricos, apresenta pesquisas sobre o público-alvo e o mercado, preocupa-se com a questão comercial do projeto, explica como o seu trabalho funciona, enfim, você faz tudo o que seria pertinente a um trabalho sério e ético. Mas aí o cliente diz apenas: eu não quero isso e ponto final, quase sempre sem justificativas aceitáveis, simplesmente porque ele não gostou. E aí, como faz? Ou você faz o que o cliente quer, mesmo explicando novamente os motivos de que este não é o caminho certo, ou você diz que o seu trabalho não funciona dessa forma e encerra o projeto. Para mim esses clientes-problema são exceção, mas já ouvi algumas baixarias e não consigo acreditar que o problema seja o meu trabalho em específico, mas sim uma falta de confiança e postura profissional do cliente. Aí vem alguém e diz: você não transmitiu confiança o bastante. Mas e aí? Quando você utiliza de outros serviços, você confia ou não no profissional contratado? Você interfere no modo de trabalhar do profissional? Diz para ele que faria melhor o trabalho dele? Acho que essas comparações são sempre válidas, pois demonstram a bizarrice que é o cliente pedir algo em específico com uma justificativa que ele inventou e acredita piamente. Talvez o problema todo repouse no fato de que trabalhar com criatividade envolve o conceito do gosto, já que criação é uma atividade de tantas possibilidades. Dessa forma o cliente se sente à vontade para opinar o que bem entender… Ah e sim, eu concordo com o autor que fazer piadinhas sobre esse aspecto lamentável da relação entre o profissional criativo e o cliente não ajuda em nada e talvez perpetue ainda mais os problemas…

  3. Nós designers passamos por essas situações descritas e exemplificadas na matéria diariamente, então não vejo como “situações exceção”. Exceção no mercado sob o meu ponto de vista é quando você é contratado por um profissional ou “cliente” que tem educação, bom senso, respeito pela sua profissão, sabe lhe ouvir, absorve os conhecimentos e “dicas” que o são transmitidos nas reuniões e nas etapas de projeto. Pode até haver uma negociação em relação ao valor, mas nada muito deselegante, algo que te deixe com “sangue quente”, ou algum argumento fora do comum como “poxa mas eu pago R$4,50 numa empadinha e esse valor num logo?”. Esse tipo de atitude o designer e qualquer profissional que trabalha com criação e projeto deveria ser premiado ao ouvir e agir de forma contida e discreta, dizendo ao cliente “Sim, esse valor corresponde na verdade a isso, aquilo, porque…”. Enfim. Não estou aqui defendendo cega ou injustamente a nossa classe (dos designers) mas presencio situações extremamente desagradáveis com muito mais frequência do que situações que deveriam ocorrer caso o Brasil fosse um país um pouco mais “bem cuidado”. Existe uma questão de educação e cultura muito forte que impacta nosso dia a dia de forma indireta, se pararmos para refletir.

    1. Talvez seja mesmo difícil separar os clientes-sem-noção dos clientes sensatos. Mas para mim os sem-noção são sempre exceção, aqueles que você já identifica pelo jeito de orçar algum material que será um caso problema, pois geralmente esse tipo de cliente pensa que entende o nosso trabalho, acha que é o sabe-tudo hehe. Difícil! Ainda assim, apesar de todos os pesares, também defendo uma postura profissional. Mas fiquei pensando.. sobre qual educação e cultura você fala? Por que você acha que há esse desrespeito na nossa área? Nas outras áreas funcionaria de modo diferente?

  4. Eu sou formado em Comunicação Social – Audiovisual e trabalho como designer gráfico a quase vinte anos. Sou de São Paulo capital e moro a quase três anos na região de Goiânia. Sabe quanto as empresas pagam em média para um designer gráfico aqui? (R$ 1000 reais – HUM MIL REAIS), se você reclamar, eles procuram outro que não exija receber mais.
    O DESRESPEITO PROFISSIONAL, A DESVALOR É ABSURDO!
    E o pior, se você reclama do salário, ainda te queimam no mercado.
    Freelancer, não adianta cobrar nada além e 200 reais, porque NÃO PAGAM.
    Eu ouvi um indivíduo me dizer com a maior cara de pau que o filho dele faz por R$ 10,00 (DEZ REAIS) um logo.
    Quer saber a realidade que passa um designer gráfico? Venha para Goiás!

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